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NOME 20 - 29,7 x 42 cm_edited.jpg

Sereio com cabeça de homem

misto sobre tela, 30x40 cm, 2017 

A figura central, híbrida e imprecisa, emerge de um mar de vermelho espesso — líquido ou simbólico, sangue ou território. Com uma mão segura a faca ainda quente do corte; com a outra, ergue a cabeça que já foi sua, ou que talvez nunca tenha sido.

Não há dor no rosto do sereio — há silêncio, como quem já atravessou muitas mortes para enfim tornar-se o que era impossível ser. A composição inverte a lógica da mitologia clássica: aqui, o canto não seduz, o canto decepa. O mar, agora ausente, é substituído por um campo de tinta pulsante, onde o corpo se desfaz de suas formas impostas.

O fundo em tons de ocre e ferrugem vibra como uma auréola profana. Não há espectadores, não há testemunhas — apenas o instante suspenso da transformação. O homem, com a cabeça arrancada, é símbolo do que foi necessário deixar para trás: gênero, forma, limite, expectativa.

A obra não narra, acusa. O gesto é radical: não se trata apenas de transfigurar-se, mas de eliminar o que impedia a existência plena. “Sereio com cabeça de homem” é declaração, vingança e renascimento.

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